Em uma região remota, havia um grande urso lutador que administrava um pedaço de terra enorme, que já tinha sido separada de uma propriedade muito maior. Durante quase todo o tempo, o urso vivia bêbado e por isso, contratou um ajudante que também se tornou seu guarda-costas: um pequeno e magro vira-latas, que apesar de ser muito disciplinado, tinha sido dispensado de um canil superlotado na cidade, e assim, passou a viver com o fanfarrão polar.
Desde os dias da grande fazenda, o urso e o cão já tinham tido problemas com um bando de lobos-cinzentos que rondava a região e ameaçava tanto a eles quanto a quem quer que cruzasse o caminho daquela alcateia. Também nesta época, surgiu pelas estradas do sul da propriedade, uma hiena mundana, que passava o tempo todo rindo e fazendo rir aos outros bichos do lugar.
Depois de um longo período, o urso acabou morrendo de tanto beber, e o cão, mesmo sem demonstrar talento ou força, assumiu o seu lugar como chefe da fazenda. Os lobos-cinzentos se aproveitaram da fraqueza do cão e continuaram as provocações. Enquanto isso, a hiena perdia seu tempo rindo da própria vida e da dos outros também.
Como a situação na fazenda ia ficando cada vez mais perigosa, o raquítico vira-latas começou a treinar técnicas de combate e logo mandou um recado para os lobos. O aviso foi colocado nos portões da propriedade com as palavras: “Não provoque cão bravo”. Os lobos, ficaram estarrecidos com o que parecia ser uma piada, e claro, não deram muito crédito àquela placa, e nem mesmo pensaram que aquilo podia fazer algum sentido.
Por muitos e muitos dias, os lobos e o cão ficaram se provocando: enquanto os lobos arranjavam mais amigos, o cão se esforçava para ficar mais forte, pois depois da morte do urso, alguns antigos amigos, o deixaram. Em certos momentos, o cão e os lobos, até mesmo se encontraram em muitos lugares, mas não puderam brigar de verdade e de maneira feroz, pois sempre algum outro bicho da floresta travava as diferenças entre eles com diplomacia.
Os anos foram passando, e aquele vira-latas agora era um grande cachorro. Ele também tinha aumentado o número de seus comparsas e ainda tratou de arranjar os seus próprios guarda-costas. Assim, a situação ia ficando cada vez mais tensa, pois os lobos estavam mais experientes e famintos, e o cão havia se tornado mais bravo e audacioso.
Aquela velha placa com o aviso “Não provoque cão bravo” ainda estava no mesmo lugar, mas parece que ninguém, exceto o cão, sabia do seu verdadeiro significado e propósito. Os lobos estavam chegando cada vez mais perto da casa do cão e este estava ficando cada vez mais impaciente e desconfiado.
Um certo dia, depois de um longo e difícil inverno, aconteceu um fato que agravou ainda mais a situação: a hiena, quase desaparecida, se aliou aos lobos e tomou posse de uma parte ao sul da velha grande propriedade, que tinha sido herdada pelo urso. Isto, lógico, desagradou muito ao cão, que se enfureceu e declarou guerra à hiena, dizendo também que os lobos não deveriam se meter na briga.
Na cabeça daquele cão, esta atitude tinha sido uma provocação grande demais para ser tolerada, e isto não podia ficar sem resposta. Ele decidiu, então, invadir o território conquistado pela hiena, mesmo que isso pudesse custar a vida de muitos dos seus amigos e guarda-costas.
Durante mais de um ano, o cão e a hiena lutaram entre si, enquanto os lobos, sem sofrer dano algum, apenas assistiram a matança de longe. As terras da hiena foram quase todas destruídas; as águas dos rios e dos lagos ficaram poluídas, e muitas vezes, a hiena teve que se humilhar implorando a ajuda de outros bichos.
Esta história ainda não acabou. o cão ainda ladra, avisando que está mais bravo do nunca; a hiena, agora, não mais rir, apenas chora a morte dos seus amigos; e os lobos, como era de se esperar, fingem não ter culpa de nada; nem de provocar o cão, nem de jogar a hiena em uma briga que ela não queria entrar.
Por fim, é bom dizer que, toda fábula tem sempre algo a ensinar, e esta não é diferente. As motivações do cão, dos lobos e da hiena representam os nossos próprios interesses como pessoas e podem não ser, talvez, totalmente compreensíveis, uma vez que, o desejo por poder, por glória e por riqueza está dentro do coração de quase todos os seres humanos.
O cão, a hiena e os lobos representam pessoas, instituições e organizações. As justificativas de tudo isso, certamente não existem e nem poderiam ser inventadas, e por isso, não são plausíveis de consideração ou compreensão, nos restando mesmo, apenas o lamento, a reflexão e a esperança.